Nietzsche: uma filosofia para se viver em tempos sombrios

Angela Zamora Cilento, Patrícia Del Nero Velasco

Resumen


O presente texto parte do pressuposto de que vivemos em tempos sombrios. Assume, igualmente, que a filosofia tem valor formativo, atribuindo sentido à vida. Nesse viés, objetiva-se discutir alguns diagnósticos para o nosso tempo a partir das ideias de Nietzsche e, primordialmente, à luz do conceito nietzschiano de vida, bem como da estreita articulação deste com as categorias estéticas e com as noções de invenção e de valor da verdade. Ademais, serão identificadas algumas advertências em obras do filósofo do martelo, as quais poderão auxiliar na compreensão da filosofia como forma de vida e, especificamente, de uma filosofia que contribua para que o homem se torne “aquilo que é”. Primeira advertência: cada ser humano tem uma medida própria; portanto, deve desprender-se da tirania da opinião pública para se tornar apto à vida, à vida como vontade de potência. Para uma vida filosófica, o ser humano deve apropriar-se do passado para ressignificar e tornar-se dono da sua própria história. À medida que utiliza a história a serviço da vida, pode o homem viver sua vida de modo intenso. Mas esta vivência requer, igualmente, que este homem possa ser capaz de esquecer. Segunda advertência: o par esquecimento e memória torna-se componente fundamental para uma filosofia de vida. Torna-se igualmente fundamental relembrar que a vida é imprevisível e não deve ser culpabilizada pelos anseios projetados e não alcançados pelos indivíduos. O homem ressentido não goza a vida em sua integridade. Terceira advertência: deve-se adotar a ideia de um devir inocente. Sob essa perspectiva, a vida pode ser apreciada como um presente (gratuidade, ao modo dos gregos): vontade de potência capaz de transmutar a dor em alegria, o choro em riso. A vida entendida em seu jogo múltiplo – como metamorfose, gênese, transfiguração – não quer a mera sobrevivência. A vida como vontade de potência é, pois, ultrapassagem. Requer, para tanto, saúde, força e o sagrado direito de dizer não. Quarta advertência: deve-se aprender a dizer não àquilo que nos oprime. O aprendizado de dizer não, mesmo ao dever, é condição para a liberdade: libertar-se para ser capaz de criar valores novos. Por fim, essa vida abundante exige também o desprendimento de pairar sobre a moral e de zombar da própria vida. Quinta advertência: temos que ser felizes com a nossa sabedoria e a nossa insanidade, descobrindo o herói e o louco que nos habitam. Uma filosofia como forma de vida reivindica que o homem se distancie de si mesmo para olhar-se do alto, colocando-se acima da moral para poder rir ou chorar sobre si – condição para que o ser humano se torne “aquilo que é”.

Palavras-chave: Nietzsche; Filosofia de Vida; Conhecimento; Arte.


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