Arendt e a cisão entre os domínios da política e da educação

José Sérgio Carvalho

Resumen


Em seu ensaio sobre a crise da educação, publicado pela primeira vez em 1958, Arendt (2006) afirma a necessidade de se estabelecer um divórcio entre os domínios da educação e da vida política. Trata-se de uma asserção polêmica, cuja compreensão exige o recurso à complexa teia conceitual em que sua perspectiva se ancora. Este artigo se propõe a elucidar o significado dessa cisão, argumentando que ela não deve ser tomada como uma afirmação do caráter apolítico da educação. Trata-se, antes, de um esforço para criar distinções e marcar as especificidades tanto da política – entendida como uma forma peculiar de organização da vida pública fundada na igual responsabilidade pelo mundo comum – quanto da educação – concebida, de forma sintética, como o processo de familiarização dos novos (as crianças) com um legado histórico de linguagens, saberes, princípios e toda a sorte de práticas sociais e heranças simbólicas e materiais reificadas em um mundo comum que as antecede. Assim, a recusa arendtiana à fusão entre a atividade educativa e ação política é, simultaneamente, um esforço para conferir dignidade a cada um desses âmbitos e entre eles vislumbrar possíveis vínculos. Isso porque a confusão (em seu sentido estrito de fusão entre dois âmbitos distintos) pode acabar por inviabilizar a relação (já que esta exige a existência de esferas que interagem e se influenciam mutuamente, mas não se confundem!). Por fim, procuramos apresentar uma dimensão ausente nas reflexões de Arendt: a distinção entre o caráter pré-político da relação pedagógica e o sentido político da experiência escolar na constituição do sujeito que a vivencia.


Palavras-chave: Filosofia da educação. Política. Educação. Arendt.


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Referencias


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